domingo, 27 de outubro de 2024

Os professores de português podem contribuir muito para o desenvolvimento do nosso "sistema" literário

Há qualquer coisa que me intriga nos professores. Parece ser a classe de profissionais que mais se envolve em actividades de transformação da nossa sociedade na dimensão política e social, sobretudo. Não saberia dizer se tais acções são positivas, patrióticas, pertinazes, inglórias ou fraudulentas. O facto é que são acções vistas por todos nós. Ou mais, de uma forma ou de outra, impactam nas nossas vidas, incluindo em dimensões das quais eles próprios se queixam. Cabe, a título de exemplo, mencionar a qualidade de ensino; as dificuldades de leitura e escrita; a iliteracia digital; acções fraudulentas dentro e fora do contexto escolar.

É exactamente neste quesito que o título deste texto encontra chão fértil para ganhar vida e gerar frutos.

O conflito entre o domínio da língua e a liberdade estética na actual produção literária moçambicana


"do que vem sendo produzido, é notório o crescimento do valor estético das obras que vão sendo publicadas, pois as condições de interação entre a crítica e a escrita também melhoraram e, por outro lado, nota-se também que já se confunde cada vez menos o que é mau domínio das linguas e liberdade poética"

Lourenço do Rosário

Não gosto de ser mal percebido nestas coisas de emitir opiniões sobre isto e aquilo. Quem gosta? Cogito, seriamente, na hipótese de passar a incluir ilustrações neste exercício, como uma espécie de tutorial para o manuseamento de uma ferramenta, do mesmo modo como o fazem os usuários do YouTube. Quem sabe ainda consigo ter lá algumas visualizações que me possam render moedas para chancelar estas ideias num volume.

A (ir)relevância de estudar literatura e linguística para se ser escritor

"Nunca tive de ouvir o hip-hop tuga para o fazer." Inicio a minha intervenção com esta frase de Sam The Kid, um rapper português que tem muito a dar aos poetas da minha terra e geração. Entre excessos de egotriping, há, nesta frase, uma verdade. Não é coisa que se possa buscar e aplicar ao contexto da escrita e dizer, com bastante infelicidade, que nunca se leu literatura para a fazer. Seria inglório, para não dizer pior. 

Sei que há muitos casos de poetas/escritores que têm uma relação umbilical com o rap e um contacto mais tardio com a literatura. Embora eu seja defensor deste fundamento para subsidiar relações intertextuais entre a escrita desta geração com o rap, isso não quer dizer que assuma a ideia de alguém dizer que nunca leu os outros para escrever: não é uma declaração honesta.

Será a coerência um elemento dispensável no texto poético?

Gosto da possibilidade de ter outros campos de saber a contribuírem para a compreensão dos estudos literários, ou, pelo menos, dos textos produzidos neste domínio de realização discursiva.

Dentre tantos, existe um que se interessa pela explicação dos modos de composição e sequencialização textual, culminando com a descrição dos mecanismos internos ou externos ao texto que condicionam a interpretação das unidades que nele coexistem.

Embora o texto poético (ou literário, em geral) se beneficie de uma certa especificidade do ponto de vista da sua composicionalidade e estilo, por estar na categoria de texto, precisa, sim, de conter algumas propriedades que o possam garantir alguma sobrevivência na relação autor-contexto-código-canal-leitor.

o que gostaria que me tivessem dito quando comecei a me interessar pela escrita/poesia?

Nos últimos tempos, ando metido em actividades de revisão/edição de textos e pouco ou nada tenho feito relativamente a um ofício me dá imenso gozo: ler, de forma crítica, os outros. Mas a vida é mesmo isto. As actividades generosas não nos dão gozo e as que nos dão, não são tão generosas.

Enfim, são "coisas da vida" como disse Milton Nascimento. Tirando essas lamúrias, tenho aprendido bastante. Parte desse aprendizado vem em forma de déjà vu. Surge daí o sentido da pergunta que intitula estas linhas.

Imagino-me, então, numa conversa em que alguém me pudesse ter dito:

domingo, 20 de outubro de 2024

Da floresta sagrada de Chirindzene às cobras que assobiam ou aos guiguisekas: encontros e distanciamentos entre lendas tradicionais e urbanas na visão de Núñez (2012)

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Lendas tradicionais e urbanas: encontros e distanciamentos

No texto “Lendas tradicionais e lendas urbanas: uma revisão conceitual”, Núñez (2012, pp. 74 – 91) começa por contextualizar o âmbito em que se discute o conceito, entre o académico e o extra-académico. Diante desta estratificação, o autor destaca o que considera “definições convencionais de natureza bastante indeterminada”. Assim, pontua que “lendas urbanas são relatos pertencentes ao folclore contemporâneo que, em que pese conter elementos sobrenaturais ou inverosímeis, se apresentam como crônicas de feitos reais sucedidos na atualidade”. Alguns destes relatos partem de eventos reais, mas em tom exagerado ou misturados com dados fictícios.