O que é epopeia?
A termo epopeia provem da palavra
grega “epopoiía” que também deriva de “épos” também pertencente ao grego e
significa “versos” e, portanto, “o gênero
épico é a narrativa em versos que apresenta um episódio heroico da história de
um povo. A epopeia nasceu no Ocidente com Homero, poeta grego que viveu entre
os séculos IX e VIII a.C. e escreveu dois poemas que constituíram os primeiros
modelos épicos: a Ilíada e a Odisséia.” Cavalcanti (2012, p. 235)
Para Figueiredo & Belo (1999, p. 111) “a epopeia é uma narração, em estilo grandioso, das façanhas heroicas de um povo, caracterizadas por uma acção una e simultaneamente variada, em que intervêm seres sobrenaturais.”
A
estas definições adicionaríamos a de Lopes (2007) segundo a qual a epopeia “a epopeia assenta as suas raízes nas mais
vetustas manifestações literárias da antiguidade. Directamente relacionada com
valores e referências culturais hoje desaparecidos, a epopeia releva de um
tempo dominado pelo mito, pelo lendário de projecção nacional e por uma
concepção orgânica do Universo.”
Portanto, esta última definição mostra-se mais
abrangente no sentido em que destaca a questão de este tipo de texto ser um poema heroico narrativo extenso,
uma colecção de feitos, de factos históricos de um ou de vários indivíduos
reais, lendários ou mitológicos.
Assim, diriamos que a epopéia eterniza lendas
seculares e tradições ancestrais, preservadas ao longo dos tempos pela tradição
oral ou escrita. Portanto, embora tenha fundamentos históricos, a epopeia não
representa os acontecimentos com fidelidade, geralmente reveste os acontecimentos
relatados com conceitos morais e actos exemplares que funcionam como modelos de
comportamento.
Assim concordaríamos com Hegel (1993, pp. 572-3) apud Cavalcanti (2012, p. 235), quando
afirma que:
a epopeia, quando
narra alguma coisa, tem por objecto uma acção que, por todas as circunstâncias
que a acompanham e as condições nas quais se realiza, apresenta inumeráveis
ramificações pelas quais contacta com o mundo total de uma nação ou de uma
época. É, portanto, o conjunto da concepção do mundo e da vida de uma nação que
apresentado sob forma objectiva de acontecimentos reais, constitui o conteúdo e
determina a forma do épico propriamente dito. Desta totalidade, fazem parte,
por um lado, a consciência religiosa de todas as verdades profundas do espírito
humano e, por outro lado, a vida concreta, a vida política e doméstica, e até
as necessidades que a vida exterior comporta e os meios de satisfazer.
Hegel
(1993, p. 573) apud Cavalcanti (2012,
p. 235) aponta ainda outros elementos constitutivos do género, que são:
Þ
Anulação do poeta como consequência
do carácter objectivo da epopeia;
Þ
A situação mais conveniente à
épica é o conflito de guerra;
Þ
A visão da epopeia é totalizante
do nacional;
Þ
A poesia épica consiste em
representar o desenvolvimento da acção;
Þ
A natureza épica não pode ser abstracta;
Þ
O acontecimento épico só pode se
concentrar em um indivíduo, etc.
Assim,
aliado a estas proposições, procurando distinguir a epopeia do romance, Bachtin
(1979, pp. 454-455) apud Lopes (2007)
acrescenta outros elementos dentre os quais podemos destacar os seguintes:
Þ
O mundo épico está separado do
presente, isto é, do tempo do cantor (do autor e do seu auditório), por uma distância
épica absoluta.
Falar em “ passado absoluto” é
falar num passado desligado do presente, decorrido num tempo decerto extenso,
mas destituído de relatividade e mesmo do sentido evolutivo e erosivo sobre as
figuras que o vivem” (Bachtin, 1966, pp. 139-140 apud Lopes, 2007), por isso o tempo da
epopeia é diverso do tempo do romance, “aquele
carece da capacidade de reenvio para o presente histórico do receptor,
capacidade que no romance tem que ver com as suas potencialidades críticas, bem
distintas da genérica tendência para a exemplaridade que na epopeia observa.”
(Lopes, 2007)
Þ
O estatuto do narrador da epopeia
tem que ver com os traços de configuração descritos e também com a primitiva
situação de comunicação narrativa que caracterizava o relato épico: enunciando
um discurso oral, o poeta dirigia-se a um auditório fisicamente presente,
evidenciando-se de forma táctica, por meio desta co-presença, a sua alteridade
e distância em relação aos eventos e personagens de que fala. Para além disso,
o narrador da epopeia pronuncia-se num estilo solene (o “som alto e sublimado” de “tuba
canora e belicosa” de que fala Camões na inovação dos Lusíadas”), estilo não raro plasmado num metro ajustado a essa
solenidade (p. ex., o decassílabo heroico). Mas aquilo que fundamentalmente
particulariza o estatuto do narrador da epopeia é a posição de transcendência
por ele adoptada;
Þ
Também pela sua estrutura externa
a epopeia deixa transparecer uma composição calculada e intencionalmente
delineada. Traduz-se essa composição na sucessão de três partes distintas:
proposição, a invocação e a narração; destas, a ultima que efectivamente, como
o termo indica, preenche os requisitos da narratividade, devendo as restantes
ser encaradas como marcos de vinculação ao cânone de epopeia;
É no decurso da narração que se manifestam os componentes da estrutura
interna da epopeia, insinuando-se a partir deles os vectores
temático-ideológicos que nela se representam; desses componentes merecem
destaque especial a acção e a personagem. Assim, a primeira privilegia
comportamentos em sintonia com o maravilhoso e com a entoação heroica
predominantes na epopeia (eventos bélicos, confrontações com elementos
atmosféricos, proezas sobre-humanas, etc.);
Portanto,
é com o suporte destas dominantes estruturais do seu tratamento estilístico que
a epopeia desenrola os grandes temas, ideias e valores que, tendo se
manifestado com especial insistência na Antiguidade e no Renascimento, entraram
em crise com advento da sociedade burguesa e do seu emblemático género
narrativo: o romance. A afirmação de empreendimentos excepcionais, a competição
dos deuses com os homens, a representação do destino colectivo de comunidades
de alcance nacional, deixam de fazer sentido quando entra em cena a personagem
individualizada, trivial e muitas vezes problemática que no romance burguês e
no realismo crítico se nos apresenta.
Estrutura externa
Como se trata de um poema longo, a epopeia é dividida em várias partes
denominadas cantos (que geralmente são
10). Os cantos são organizados de modo a cumprir funções preestabelecidas. Estes
são constituídos por um
número variável de estâncias/estrofes de
oito versos (oitavas), tendo cada verso 10 sílabas métricas formando assim
versos decassílabos e que geralmente contêm sílabas tónicas nas posições 6 e 10, respectivamente, o que lhes
confere a qualidade de decassílabos heroicos,
apresentado o seguinte
esquema rimático: a-b-a-b-a-b-c-c, sendo rima cruzada
nos seis primeiros versos e emparelhada nos dois últimos.
Estrutura interna
Como o dissemos
acima, na estrutura da epopeia, os cantos são organizados de modo a cumprir
funções preestabelecidas, entre as quais:
Proposição: o poeta define o tema e o herói de seu poema;
Invocação: o poeta pede a musa (divindade inspiradora da
poesia) que lhe inspire, para desenvolver com mestria o tema de seu poema;
Dedicatória: o poeta dedica a obra a uma personagem ilustre;
Narração: o poeta narra as aventuras de
seu herói;
Conclusão/epílogo: o poeta encerra sua
narrativa, após relatar os feitos gloriosos que marcaram a trajectória de seu
herói.
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