Sou duma geração em que a cultura de leitura era-nos incutida na sala de aula e os textos, esses os tínhamos de cor. Desses tempos, guardo a memória de textos como "quem põe o guizo ao gato" ou a célebre frase "o mundo ralha de tudo" de “o velho, o rapaz e o burro”.
Crescemos. E esses textos contribuíram no nosso amadurecimento nas letras e na vida pessoal. Vieram-nos, então, os escribas com que privávamos os corredores dos liceus e outras paragens dos mundos desta vida e não houve nada tão extasiante que ler "Cão Tinhoso" que se antecedeu aos Ungulanis, Coutos, Cassamos, Paulinas, Muiangas e outros tantos que encontraram na escrita uma forma de nos roubar a atenção e incitar os nossos aplausos. Vivamente aplaudimos!
Passaram-se os anos e foram sempre esses os nossos escribas. Os que nos vinham eram meros jovens que ainda tinham muito que aprender: com a escrita não se brinca. Chegaram até a sentenciar um marasmo na literatura moçambicana como se sugerissem que entre eles (senão todos) havia o poder de a revigorar qual nazarenos ante um Lázaro há muito enfermo.
Com esses era simples. Bastava que os tirássemos os holofotes nos jornais e mandássemos as suas revistas para as cucuias. Ei los: ficavam mudos os wannabe(s) e a tranquilidade habitava-nos novamente.
Eis então que para o nosso espanto, os mesmos a quem defendemos para a manutenção das lides literárias, nutrem apetites de paladinos de talentos e apadrinham movimentos, grupos e associações em que mais do que a escrita partilham mesmices de que padecem na sua adolescência sedenta de holofotes neste novo engodo imparável que é a internet. Criam blogs. Sites. Páginas nas redes sociais. Revistas. Editoras. Alguns invadem as redações dos jornais. E roçam-nos os tímpanos com a campanha que é já um hino "recebam hoje o escritor..." com apenas dois poemas mal concebidos ou duas narrativas com uma sintaxe agramatical. Tudo em nome dessa tal liberdade na criação!
Vemos hoje, com um misto de dó e lamentos, novos wannabe(s) que mal se desfizeram da infância a se canonizarem através dos seus clubes de amizades e já se sentem Coutos. Se fossem da metrópole ou se nela estivessem, antes fosse. Que nada! Do seu gueto sem livrarias sobressaltam-nos a tranquilidade com o seu pseudo-brio na escrita.
«Pa.p.parem esses gr...gru.gruuuu.pos! F.fechem.lhes as p.por.portas da in.in.internet! Inter.di.di.tem a.a.as li.cen.lincen.ças para no.nov.novas ed.edito.ras.»
É urgente: com a escrita não se brinca.
Metrópole, Março de 2021
O autor: Boom Chaka
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