quarta-feira, 8 de abril de 2015

Fundamentação dos discursos: social, histórico e estético da literatura através do texto “Deixa passar o meu povo”

O discurso social da literatura é normalmente encontrado na militância/engajamento do texto em relação a um movimento social de vanguarda, que transpareça em si um manifesto social que inspire a mudança de um determinado facto para o que se pressupõe que seja melhor, tanto pelo autor textual assim como pela conjuntura social. Neste sentido, em “Deixa passar o meu povo” de Noémia de Sousa, nota-se que existe um sonho expresso como reação ao que era visto e vivido socialmente que era a ausência de liberdade e, além de ser um mandamento em relação ao colono, como forma de contestação à condição de subjugação a que o negro estava exposto, neste caso, na sua própria terra, este texto afigura-se também um convite ao repúdio de tudo que foi o ensinamento do branco/europeu/colonizador como modelo de civilização e assunção de algo que é tido como tipicamente africano, tal como ilustram as seguintes palavras:
“E enquanto me vierem do Harlem/ vozes de lamentação /não poderei deixar-me embalar pela música fútil das valsas de Strauss.
Portanto, pelo facto de este discurso socialmente engajado ser mimese/imitação, na asserção platónica e aristotélica do termo, de determinado momento imprescindível do ponto de vista histórico, “Deixa passar o meu povo”, tal como outros objectos artísticos, ou mais especialmente, outros textos literários política e socialmente engajados, constitui um documento revestido de considerável valor histórico no sentido em que responde claramente à pergunta: o que terá sido feito em momentos que precederam a independência de Moçambique?
Ao que se pode, através deste texto, inferir que o que era feito pelos movimentos revolucionários fora de África serviu de inspiração para os africanos/moçambicanos em África, no sentido em que se diz: “se eles são negros na mesma condição que a nossa e fazem/fizeram aquilo, nós também podemos”, pois a referência a diferentes movimentos ou representantes de tais movimentos negritudinistas visa essencialmente a exaltação do seu “heroicíssimo” para que os africanos em África possam tê-los como exemplo e sair do conformismo que os assolava.
Esta mesma referência aos movimentos negritudinistas circunscreve-se na perspectiva estética de “Deixa passar o meu povo” no sentido em que a sua textualidade é, maioritariamente, assegurada pela intertextualidade que do ponto de vista tipológico afigura-se exoliterária (por ocorrer entre um texto literário e outros objectos semióticos) e do ponto de vista de forma, manifesta-se através da alusão a personalidades e movimentos negros que empreenderam algum tipo de revolução no contexto musical.

 Este aspecto é observável a partir do título, em que “deixa passar o meu povo”, com o verbo “deixar” expresso num sentido imperativo em relação ao branco. Ainda em relação ao título, importa acrescentar que é um “empréstimo” da música de Louis Armstrong do movimento negro “hot five” cuja postura na música originou o blues e o jazz que foram movimentos musicais de raiz negra e revolucionaram o contexto musical dos Estados Unidos.

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