quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Como é que o feminismo responderia a isto?

Parte 1. 

"  Espera um minuto, irmão. Não senta aí e diga que a maioria dos homens negros estão fazendo a coisa certa. Se existisse, 60% das famílias negras não seriam lideradas por mulheres. E, portanto, nossas comunidades não estariam como estão. Nossos meninos não seriam gays. Não estariam andando nas ruas, ok? E eles teriam actividades de lazer construtivas, irmão. Não senta aí para mentir na televisão e para toda a comunidade negra. Você está a se prostituir, irmão!"

Estas foram as palavras atiradas ao ar por um espectador na plateia, enquanto decorria o debate entre duas figuras: prof. Richard Majors, psicólogo e autor do livro Cool Pose (Os dilemas da masculinidade negra dos E.U.A) e a escritora Shahrazad Ali.

Naquele preciso episódio, o programa Donahoe Show promovia o debate sobre os conteúdos de um dos livros mais controversos da década de 90 para a comunidade negra norte americana: o guião do homem negro em compreender a mulher negra.

De facto, uma razão motivou a senhora Shahrazad Ali para escrever o livro: a ausência do homem (afro-americano) na família e a neutralidade da mulher em ser submissa ao homem. 

Atrevo-me a escrever submissão porque o real sentido dessa palavra, segundo o contexto, não é o de servidão. A verdade é que este foi um dos termos mais distorcidos para justificar o abuso e opressão.

Quando temos uma cooperação voluntária, movida por respeito e confiança, o termo submissão entra para descrever esta condição em que a mulher de encontra em relação ao homem.

As palavras cuspidas pelo senhor em direcção ao prof. Majors eram uma forma de protesto, porque, na visão do professor, o homem negro estava a se dar bem em todas as esferas da vida. Contudo, o homem na plateia contestava a realidade dos factos.

Passados 32 anos, os argumentos e fortes sentimentos partilhados por uma parte da plateia que não concordava com o livro e a outra que vislumbrava, no livro, uma possível solução para os dilemas que se vivia naquela década:

 1. A rápida destituição da família negra nos Estados Unidos. Os índices de divórcio foram tão altos entre os casais negros que cerca de 59% das crianças viviam apenas com um dos pais (sendo que a maioria vivia com a mãe solteira ou viúva);

1.1 Esta destituição da família negra iniciou nos meados da década de 50, onde cerca de 75% da população negra era casada e vivia na mesma casa, caindo esta percentagem para 23% na década de 90. (Besharov, West)

2. O número de homens negros que eram presos nas prisões federais e estaduais aumentou de 39% para 53% entre as décadas 70 e 90. Até 1997, os negros constituíam 49.2% da população prisional e os brancos 48.3%.(Human Right Watch)

Com estes dados, é possível perceber a realidade que o homem negro-americano vivia naquela década.

Este fenómeno deve-se aos desafios que muitas famílias negras encaravam nestes cenários: fragilidade sistemática e estrutural (demográfica, sócio-económica e histórico), aliada aos elevados índices de racismo, opressão, desemprego e impotência.

Quanto à sociedade africana, curiosamente observava-se (na mesma década) uma similaridade nos fenómenos:

1. Alto índice de desemprego na década de 90. Embora se verificasse um aumento da força de trabalho, existia um enorme índice dos níveis de analfabetismo, o que condicionava na alocação da maioria das pessoas nos trabalhos do sector formal. E isto foi como uma força motriz para o “surgimento” de trabalhos no sector informal.

Falando particularmente de Moçambique, na década de 90,  30 a 40% das famílias, dependia dos trabalhos no sector informal.

2. Aumentava também o número de homens presos.

Uma notícia publicada pela New York Times em ano de 2005, apontava que 3/4 dos prisioneiros em Moçambique não tinham sido ainda julgados. A maioria destes prisioneiros eram vítimas de um sistema judicial corrupto e incompetente.

3. Foi difícil encontrar um dado exacto que apontasse os índices de divórcio, porque, na altura, as sociedades da África subsaariana ainda tinham como modelo familiar a poligamia. Devo dizer que o elevado índice de divórcio em países africanos tem aumentado em 30% nestes últimos anos.

Deve estar a questionar: estes dados vêm a que propósito?

A verdade é que com o aumento de ideais feministas na sociedade africana, cresce também o número de homens com fragilidade na saúde mental. Há quem acredite que não existe relação alguma, mas na verdade existe.

O meu maior problema foi de tentar perceber o seguinte: se a camada mais frágil é a das mulheres, crianças e idosos, por que razão há números elevados de homens que morrem por crimes violentos, suicídios ou problemas mentais graves?

É inegável dizer que nós, mulheres, não dependemos do homem para nada. Podemos ser as provedoras e cuidadoras. Contudo, existe uma base científica que contradiz essa declaração.

O homem e a mulher NÃO são a mesma coisa. Isso é ditado pelos nossos hormônios.

Devemos muito ao homem, porque sem a sua participação não teríamos uma sociedade devidamente estruturada e funcional.

O que tem acontecido é uma morte silenciosa no lado do homem. Onde ele não consegue ver a relevância do seu papel como esposo e pai. 

Passados 32 anos, a indignação reflectida na voz daquele espectador, é notável na sua pior versão. O que acontece com o homem que perde o seu rumo na família? A criança fica afectada, a sociedade torna-se um embrulhado entre muitos outros trapos. Tudo se confunde.

O sistema colonial e o comércio transatlântico mudaram completamente a dinâmica social que África tinha, impondo normas ocidentais e contribuindo para a desigualdade social. Seria curioso dizer que as reformas feitas num ambiente em que respirava novos ares de liberdade recém colonial não foram suficientes para emendar os danos causados pelos regimes, principalmente a nível do sector familiar. O que encaramos, ainda, é um alto índice do homem negro a enfrentar limitações socio-económicas.

Enquanto uns e umas priorizam o feminismo concebido por mulheres brancas (que desde a época medieval eram consideradas simples vassalas, ao contrário da mulher negra), outros procuram formas de perceber até que ponto o feminismo foi um factor de incentivo para o descaso que hoje se dá ao homem.

 

Escrito por: Maya Ângela

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